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Os tipos psicológicos e o processo de individuação em Jung

 

Na teoria dos tipos ou funções psíquicas, Jung oferece uma abordagem para compreensão das várias manifestações e formas de personalidades atuantes com comportamentos e julgamentos diferenciados. Ele vai estudar o psiquismo a partir do comportamento da energia psíquica (ampliando o conceito de libido) de uma perspectiva “de dentro para fora”, a partir do indivíduo.

Cada tipo tem uma forma de manifestação criativa e mecanismo compensatório. Jung descreveu dois modelos básicos de percepção: introversão, onde o psiquismo é estimulado pelo mundo interno e extroversão, onde o psiquismo é focalizado sobre o mundo externo (JUNG, 2013b). Dentro de cada modelo há quatro dimensões da consciência: pensamento, sentimento, intuição e sensação. Como é possível combinar os dois modelos com os quatro modos de percepção (as funções da consciência), configuram-se dezesseis tipologias aproximadamente, como por exemplo o sujeito “pensador – intuitivo – introvertido” ou o sujeito “extrovertido – sensação – sentimento”.

Jung afirmou que a parte simbolizadora, capaz de fazer representações da mente, operando mais por analogia e correspondência, menos por explicação racional seria típica dos modelos “racionais”. As funções “pensamento” e “sentimento” seriam racionais por envolverem um ato de julgamento, enquanto as funções de “sensação” e “intuição” seriam não racionais, pois respondem aos estímulos sem ocorrência de julgamentos. Para Jung todo o indivíduo tem os dois tipos de atitude e as quatro funções da consciência, mas usa um tipo e uma função como dominância, sendo essa a função principal (ou superior). A atitude inferior é oposta à principal e as outras funções são auxiliares.  A função inferior será sempre a menos adaptada, aquela que representa um desajuste no comportamento social, com aspectos sombrios da personalidade, mas que ao mesmo tempo, pode representar uma fonte de desenvolvimento psíquico em certos contextos.

De acordo com Jung (2013a), tanto as atitudes de introversão como de extroversão e as quatro funções psicológicas estão potencialmente atuantes nos indivíduos, mas no processo adaptativo vão diferenciando-se como função superior, auxiliar e inferior. A superior ou principal domina na consciência. A auxiliar apoia a principal e é complementar a ela e a inferior se aloja no inconsciente.

As funções inferiores carregam os aspectos mais sombrios da personalidade, mobilizam pouca energia psíquica para emergirem na consciência. No processo de individuação as funções inferiores são potenciais poderosos de desenvolvimento psíquico, na assimilação pelo consciente de conteúdos que foram reprimidos pelo ego. Jung chamava esse processo de “conciliação dos opostos”.  Assim, o processo de individuação, na verdade é a assimilação consciente das quatro funções, integradas e não anuladas, numa nova forma de energia em equilíbrio. Conforme Von Franz (1995):

 

Nesse momento, a pessoa, por assim dizer, transmite o seu sentimento de vida para um centro interior e as quatro funções permanecem apenas como instrumentos que podem ser usados à vontade, para serem postos para cima ou para baixo. O ego e sua atividade consciente não estão mais identificados com nenhuma das funções. (p. 95).

 

Retomando o modelo junguiano de psique, as forças arquetípicas são constituidoras do inconsciente coletivo. A personificação do princípio feminino no inconsciente masculino, nomeado como Anima, por Jung, resulta das experiências do homem com o feminino ao longo de milênios formando uma energia arquetípica. A personificação de aspectos masculinos no inconsciente da mulher, o Animus, tem como primeiro objeto a figura do pai. Como toda ação arquetípica, Animus e Anima, fazem a ponte na relação dialética entre consciente e inconsciente. A função transcendente da psique seria, assim, a capacidade de estabelecer essa relação, a troca de polaridades, por meio da simbolização, da superação da condição unilateral do ego.

Outro conceito caro à psicologia complexa é o assim chamado processo de individuação. O principium individuationis tem origem, na reflexão junguiana, a partir da filosofia grega antiga, relacionado ao princípio da transformação das coisas em seu contrário, a enantiodromia. O psiquismo evolui em constante estado de tensão entre o que somos de fato e o que buscamos ser, nas palavras de Jung, entre a “jornada do ego” e a busca do “Si mesmo”.  Jung, discutindo o significado da manifestação simbólica para a ampliação dos conteúdos inconscientes, nos diz que:

 

Todo extremo psicológico contém secretamente o seu oposto ou está de alguma forma em estreita relação com ele. Na verdade, é desta contradição que ele deriva a dinâmica que lhe é peculiar. Não existe rito sagrado que eventualmente não se inverta em seu oposto, e quanto mais extrema se tornar uma posição, tanto mais se pode esperar a sua enantiodromia, sua reversão para o contrário. O melhor é o mais ameaçado com certa perversão diabólica, pois foi o que mais reprimiu o mal. Esta estranha relação com próprio oposto aparece também na linguagem como na comparação entre o bom, melhor, o melhor. O que acontece na linguagem ocorre também na mitologia onde na versão de uma lenda está escrito “Deus”, em outra versão está o diabo. E quantas vezes, na história das religiões, rito, orgia e mistério degeneram em depravação licenciosa! (JUNG, 2013c, p. 441)

 

A individuação seria assim um processo doloroso de busca de níveis cada vez mais profundos ou plenos de identidade. De um lado há um processo estruturador do ego que suporta a responsabilização, a tomada de decisão, a capacidade de assumir um destino. Do outro, há um processo de simbolização crescente, de leitura profunda dos sinais que surgem no plano inconsciente. Interior e exterior, dentro e fora, dimensões que se opõe e se completam.

Essa busca identitária inconclusiva revela qualidades e fraquezas, acelera o processo de maturidade. Assim, para Jung o processo de individuação é a própria formação e evolução da personalidade, ao mesmo tempo, graça e maldição. Segundo ele “sua primeira consequência é a separação consciente e inevitável do ser singular da indistinção e da inconsciência do rebanho”, e mais adiante: “somente quem conscientemente consegue dizer sim ao poder da determinação interna que lhe vem ao encontro poderá tornar-se personalidade.” (JUNG, 2018a).

 

Referências:

JUNG, C.G. Da formação da personalidade, OC 17 §294 e §308, Editora Vozes, 2018a.

JUNG, C.G. Tipos Psicológicos, Obras Completas, 6, 8ª edição, Editora Vozes, 2013b

JUNG, C.G. Símbolos da Transformação, 9ª ed., 2013c.

FRANZ, M. L. A função inferior. In: FRANZ, M.L.; HILLMAN, J. A tipologia de Jung. São Paulo: Cultrix, 1995

 

Texto: Jackson De Toni - Especialista em Psicologia Junguiana

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